domingo, 17 de janeiro de 2010

Descobrindo o frio e a neve.

Para um estrangeiro vindo de um país tropical, viver na neve até que é fácil: basta usar a roupa e o sapato adequados. Mas isso se descobre gradativamente. Antes é preciso algumas experiências de como não se viver na neve com roupas e sapatos inadequados.

Antes eu achava que neve era tudo igual, neve é neve, floquinho de gelo caindo do céu. Até que uma amiga russa me explicou que não, e de neve ela entende. Abriu a janela do quarto e, respirando fundo o ar de uma noite fria no dia que começou a nevar em Lyon, disse “é, começou a nevar, é cheiro de neve.”

Depois me explicou que a neve do campo é diferente da neve dos centros urbanos, porque os ares são diferentes. Disse que tem neve mais fofinha, neve mais agressiva, floco pequeno, floco grande, pingos de chuva congelados, e que a neve em Lyon é bem diferente da neve em Moscou. E me mostrou fotos de Moscou com neve e de uma região afastada de Moscou com neve. De fato é diferente.

Neves depois, eu descobri sozinha outras coisas: que a neve alegra - e muito - o inverno; que quando neva, a neve se acumula bem fofinha no chão, e depois de uns dias ela vai virando gelo e escorrega muito; que de noite quando bate luz no chão coberto de neve, ela brilha como se tivessem jogado um pouco de gliter nela; que quando a neve vai descongelando e sumindo é bem feio, uma contradição com a beleza das coisas todas branquinhas; etc, etc...

Mas eu ainda não sei reconhecer cheiro de neve. Já de maresia eu entendo, é cheiro de mar. E boneco de neve eu nunca fiz, ajudei a fazer uns dois, mas sem muita desenvoltura. Já castelo de areia na praia, isso eu sei fazer, e com primor. Agora eu sei que existem duas maneiras bem diversas de se divertir na infância: como criança da neve, e como criança da praia. Eu fui uma criança da praia, que bom.

Engraçado que essa minha amiga russa me disse, depois de explicar as diferentes neves, que para ela praia é tudo igual, praia é praia, areia e mar. Então foi minha vez de explicar que cada praia é diferente de outra, que as areias são diferentes, que o mar se comporta de maneiras diferentes, que a maré muda, que algumas têm sargaço e outras não, que em algumas a areia é fofa e em outras é mais dura, que algumas têm mariscos, outras estrelas-do-mar, e mostrei uma foto da praia do amor em Pipa e outra de Tamandaré. Diferentes.

Agora eu tenho dentro de mim a sensação ainda maior de que meu coração e minha pele são mesmo muito tropicalientes.

Recife às seis horas da manhã.

Lyon às dez horas da manhã do mesmo dia.

Um comentário:

Rite disse...

Tua carne é de carnaval e de mar. Teu coração é tropical.

O meu é de saudade.